“O PÂNTANO político – o « marais » , como lhe chamam os franceses há dois séculos – é um terreno propício à gestação de monstros. A História está cheia de exemplos. O «marais» é o centro grisalho e medíocre onde as opções políticas fundamentais tendem a esbater-se e a diluir-se , tornando-se mais ténues e obscuras , menos contrastadas e visíveis .
A tentação irresistível de agradar aos eleitores flutuantes e marginais , cujos votos poderão ser decisivos para alcançar o poder, acaba por enfraquecer os partidos políticos dominantes. O pêndulo eleitoral passa a oscilar entre o centro-direita e o centro-esquerda – já não entre a direita e a esquerda . Instala-se o rotativismo político a uma velocidade de cruzeiro , a gestão do poder transforma-se numa alternância sem alternativas , a vontade do eleitorado vai-se dissipando no « nevoeiro » do centrismo , aumenta a apatia política e generaliza-se o conformismo .
A combinação entre a fraqueza e a força dos partidos que dominam o sistema e o centrismo insípido , incolor e inodoro que caracteriza o poder , restringe progressivamente a influência dos cidadãos na vida política . Quando a crise espreita e aumentam as incertezas em relação ao futuro , o conformismo generalizado acaba por se transformar em contestação , repúdio e revolta . O voto de protesto torna-se inevitável e é canalizado para os extremos do espectro político . É o tempo dos demagogos, dos agitadores populistas, dos «homens providenciais» que ameaçam restabelecer a ordem e reabilitar a pátria com a força do ”braço direito” . Expresso 27 de Abril 2002