Domingo, 27 de Dezembro de 2009
27 Dezembro 2009 - 00h30
Dia a dia
Alta protelada
Os políticos mais ligados à gestão pura e dura do poder de Estado sempre foram criativos na invenção de palavras que camuflem uma tragédia real. Na guerra dos Balcãs, quando a aviação aliada matou civis, rapidamente chegou a todos os órgãos de Comunicação Social do mundo a expressão "danos colaterais".
Amortecia-se assim as imagens de crianças, mulheres e idosos mortos. O "fogo amigo", já se sabe, é quase velho de séculos, e traduz o momento nefasto em que aliados ou soldados do mesmo Exército se matam por engano. A utilização das palavras como arma de suavização do horror da guerra é uma tradição antiga. E fez escola. Agora, alguém nos hospitais portugueses inventou a expressão "alta protelada" para significar, numa leitura mais imediata, alta adiada. Adiada a quem? Às centenas de idosos que famílias portuguesas abandonam nos hospitais. Uns por falta de recursos, outros por indiferença pura e simples. As altas proteladas são um miserável eufemismo de algo que a todos deixa mal: às ditas famílias, ao sistema de saúde, aos sucessivos governos, a todos nós, enquanto comunidade a quem não interessa este tipo de dramas silenciosos. Aqui, porém, não há palavras que valham: é o abandono puro e simples de pessoas incapacitadas e é muito, muito feio!
EDUARDO DÂMASO _ DIRECTOR ADJUNTO CM