José Manuel Moran, especialista em projetos inovadores na educação presencial e à distância
Há uma preocupação com ensino de qualidade mais do que com a educação de qualidade. Ensino e educação são conceitos diferentes. No ensino se organizam uma série de actividades didácticas para ajudar os alunos a que compreendam áreas específicas do conhecimento (ciências, história, matemáticas).
Na educação o foco, além de ensinar, é ajudar a integrar ensino e vida, conhecimento e ética, reflexão e ação, a ter uma visão de totalidade. Fala-se muito de ensino de qualidade. Muitas escolas e universidades são colocadas no pedestal, como modelos de qualidade. Na verdade, em geral, não temos ensino de qualidade. Temos alguns cursos, faculdades, universidades com áreas de relativa excelência. Mas o conjunto das instituições de ensino está muito distante do conceito de qualidade.
O ensino de qualidade envolve muitas variáveis:
Organização inovadora, aberta, dinâmica. Projeto pedagógico participativo.
Docentes bem preparados intelectual, emocional, comunicacional e eticamente. Bem remunerados, motivados e com boas condições profissionais.
Relação efetiva entre professores e alunos que permita conhecê-los, acompanhá-los, orientá-los.
Infra-estrutura adequada, atualizada, confortável. Tecnologias acessíveis, rápidas e renovadas.
Alunos motivados, preparados intelectual e emocionalmente, com capacidade de gerenciamento pessoal e grupal.
O ensino de qualidade é muito caro, por isso pode ser pago por poucos ou tem que ser amplamente subsidiado e patrocinado.Poderemos criar algumas instituições de excelência. Mas a grande maioria demorará décadas para evoluir até um padrão aceitável de excelência.Temos, no geral, um ensino muito mais problemático do que é divulgado. Mesmo as melhores universidades são bastante desiguais nos seus cursos, metodologias, forma de avaliar, projetos pedagógicos, infra-estrutura.
Quando há uma área mais avançada em alguns pontos é colocada como modelo, divulgada externamente como se fosse o padrão de excelência de toda a universidade. Vende-se o todo pela parte e o que é fruto as vezes de alguns grupos, lideranças de pesquisa, como se fosse generalizado em todos os setores da escola, o que não é verdade. As instituições vendem externamente os seus sucessos - muitas vezes de forma exagerada - e escondem os insucessos, os problemas, as dificuldades.
Temos um ensino em que predomina a fala massiva e massificante, um número excessivo de alunos por sala, professores mal preparados, mal pagos, pouco motivados e evoluídos como pessoas.
Temos bastantes alunos que ainda valorizam mais o diploma do que o aprender, que fazem o mínimo (em geral) para ser aprovados, que esperam ser conduzidos passivamente e não exploram todas as possibilidades que existem dentro e fora da instituição escolar.
A infra-estrutura costuma ser inadequada. Salas barulhentas, pouco material escolar avançado, tecnologias pouco acessíveis à maioria.
O ensino está voltado, em boa parte, para o lucro fácil, aproveitando a grande demanda que existe, com um discurso teórico (documentos) que não se confirma na prática... Há um predomínio de metodologias pouco criativas; mais marketing do que real processo de mudança.É importante procurar o ensino de qualidade, mas conscientes de que é um processo longo, caro e menos lucrativo do que as instituições estão acostumadas.
Nosso desafio maior é caminhar para uma educação de qualidade, que integre todas as dimensões do ser humano. Para isso precisamos de pessoas que façam essa integração em si mesmas do sensorial, intelectual, emocional, ético e tecnológico, que transitem de forma fácil entre o pessoal e o social. E até agora encontramos poucas pessoas que estejam prontas para a educação com qualidade
Texto publicado no livro Novas Tecnologias e Mediação Pedagógica, 12ª ed. Campinas: Papirus, p.12
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