Na sequência da polémica sobre as escolas privadas com contrato de associação e das muitas dúvidas que subsistem sobre qual o real custo de cada aluno para os contribuintes no sistema público de ensino básico e secundário, resolvi pôr mãos à obra. Para atingir esse objectivo são necessários dois dados essenciais: Os gastos totais do estado com o ensino básico e secundário, por um lado, e o número de alunos servido pelo sistema público. Previsivelmente, os primeiros dados podem ser obtidos junto do Gabinete de Gestão Financeira do Ministério da Educação; para os segundos, podemos sempre contar com o excelente Pordata.
Uma leitura do relatório de execução orçamental do Ministério da Educação (último ano disponível 2009) permite ter uma ideia dos gastos agregados. Infelizmente estes são insuficientes para fazer análises cruzadas, mas podemos pelo menos ver que a esmagadora maioria dos custos são com salários (na óptica funcional, correspondendo a cerca de 70% do total) e com o sistema de ensino (na óptica sectorial, correspondendo a cerca de 80% do total). Cerca de 5% do orçamento destina-se a investimento, a maior parte do qual para modernização do parque escolar. Uma pequena parte destina-se ao mui-socrático Plano Tecnológico.
Os dados acima representados dão uma ideia geral dos gastos do ME. Para fazer o cálculo, contudo, há que extrair os números específicos do básico e secundário. Dos 5632 milhões de euros gastos no sistema de ensino oficial, 540 milhões são para o pré-escolar, que não conta para o que pretendemos, e 294 milhões são para financiar estudantes no ensino particular, em grande parte os tais contratos de associação. Sobram 4797 milhões de euros.
O denominador que pretendemos para estimar o custo médio por aluno no ensino público básico e secundário é o numero de alunos presente no dito sistema. Segundo o Pordata, existem 1.692.284 alunos no ensino básico e secundário em Portugal. Este número exclui os cursos profissionais, que agora estão dentro de uma rúbrica orçamental separada (Novas Oportunidades). Inclui, no entanto, os alunos do ensino recorrente, pela simples razão que o custo apresentado no orçamento do ME não indica quanto do gasto total se destina ao ensino geral e quanto ao ensino recorrente. Isto significa que o número que vamos obter não será completamente exacto, pois os valores são diferentes.
Deste número de alunos, 309.271 frequentam o ensino particular pelos seus próprios meios; outros 96.518 frequentam o ensino particular com ajuda, total ou parcial, do Estado. Sobram 1.286.495 alunos no ensino público, básico e secundário, operado pelo estado. O resultado directo indica um custo anual médio por aluno de 3729 euros. Não muito diferente do valor mencionado pelo Secretário de Estado João Trocado da Mota para 2011. No entanto, este custo enferma de alguns problemas, assumindo que o objectivo é comparar o custo entre ensino público operado pelo Estado e ensino privado (quer público, quer não):
- O ensino operado pelo estado assenta numa base de capital investido. O ensino privado tem no seu preço todas as componentes de custo, incluindo a rentabilização do capital investido.
- Todos os anos o estado investe milhões de euros na manutenção do parque escolar. Tal como no ponto 1, esse custo está embebido no preço do ensino privado. A título de exemplo, se alocassemos ao custo total com o ensino básico e secundário o montante investido em melhoramentos, o custo médio por aluno subiria para cerca de 4000 euros anuais (um acréscimo de mais de 7%).
- Uma parte significativa dos custos administrativos anuais do ME, cerca de 100 milhões de euros, poderá estar ligada à operação do sistema. (este ponto carece de mais análise).
- Existem custos adicionais com o parque escolar. Esses custos estão distribuidos pelas diversas autarquias, alguns provavelmente fora da rúbrica de transferências do ME, surgindo por isso noutras partes do orçamento do estado.
Esta análise sugere fortemente que o mix de despesas do estado em educação deveria ser radicalmente diferente. Seria muito mais racional recorrer em maior proporção à operação privada do sistema. Isto não quer dizer necessariamente que as reclamações das escolas com contrato de associação estejam correctas. Não é obrigação do estado assegurar a viabilidade económica de uma ou outra escola privada. Mas a contra-argumentação de que o público sai mais barato ou que no privado “há lucro” é ainda mais disparatada. Um sistema baseado na liberdade de escolha, potencialmente recorrendo a um sistema de vouchers, com possibilidade de suplemento privado, não só sairia mais barato para os contribuintes, como provavelmente possibilitaria um alargamento da oferta.