Quinta-feira, 27 de Janeiro de 2011
A questão do recenseamento eleitoral, e dos eleitores-fantasma, e a sua influência na dimensão da abstenção nestas presidenciais não foi até agora abordada, mas pesa na interpretação que há-de ser feita dos resultados. É que o problema na eleição presidencial não se circunscreveu ao boicote encapotado da eleição, com o alibi do Cartão do Cidadão (já identificado nas eleições de 2009) através da mudança sem aviso de secção de voto, mudança de freguesia sem aviso/notificação, impedimento de acesso em tempo ao número de cartão de eleitor e não realização de campanha para esclarecimento dos eleitores, nem de incentivo ao voto. Perguntou um comentador do blogue sobre a discrepância exorbitante no número de eleitores e da população residente em Portugal com 18 e mais anos.Fui investigar e junto alguns factos.Relativamente aos eleitores, de acordo com os dados do portal Eleições Presidenciais da Direcção-Geral da Administração Interna (DGAI) do Ministério da Justiça:- Em 2011, o número de eleitores em Portugal (território continental, Açores e Madeira) é 9.427.728, a que se juntam 210.707 eleitores residentes no estrangeiro.
- Em 2006, o número de eleitores em Portugal (território continental, Açores e Madeira) era 8.835.237, a que se somavam 173.877 eleitores residentes no estrangeiro.
- Portanto, nos últimos cinco anos, entre 2006 e 2010, o número de eleitores no território nacional cresceu no montante de 592.491 (6,7%).
Comparando agora com a população residente em Portugal, segundos dados do Instituto Nacional de Estatística:- Em 2009 (último valor conhecido), a população residente em Portugal era 10.637.713.
- A população residente dos 0-14 anos era de 1.616.617.
- Assumindo, por conveniência, que existe uma distribuição proporcional desta população dos 0-14, por anos, então, o número de pessoas residentes em Portugal dos 15 aos 17 anos, em 2009, seria 346.417 (através da análise de sensibilidade, o valor com a utilização do segmento dos 15 anos 24 anos pouco variaria, situando-se nas 354.430 pessoas).
- Assim, em 2009 (há um ano) o número de pessoas residentes em Portugal com 18 e mais anos seria 8.674.679 pessoas.
- Porém, em 2008 (último ano conhecido), o número de estrangeiros residentes em Portugal era de 436.020.
- Aplicando, um factor semelhante (81,55%, embora a taxa de imigrantes solitários e sem filhos seja maior do que nos nacionais) da população total residente em Portugal, pode calcular-se que em 2008, o número de estrangeiros em Portugal com mais de 18 anos não seria menor do que 355.574: um número que se poderá deduzir (descontando a diferença de ano entre 2008 e 2009) ao valor total de população residente em Portugal em 2009, levando o número de cidadãos nacionais a residir em Portugal em 2009 com mais de 18 anos para não mais de 8.319.105 pessoas.
Mas, se há um ano (em 2009), o número de residentes em território nacional com 18 anos e mais era cerca de 8.319.105 pessoas, já o número de eleitores no final de 2010 era de 9.427.728... Subtraindo, e descontando o facto dos dados dos eleitores serem de 2010 e os da população serem de 2009, verifica-se que existem cerca de 1.108.623 eleitores a mais no recenseamento eleitoral em Portugal do que a população com mais de 18 anos (idade eleitoral), isto é, 11,76% do total de eleitores do recenseamento em 2010.Segundo os dados da DGAI, a abstenção na eleição presidencial de 2011 no território nacional foi de 52,48% (no estrangeiro, a abstenção foi muito maior: 94,6%). Deduzindo os 1.108.623 eleitores-fantasma dos cadernos eleitorais do Governo, e tendo em conta o número de 4.479.615 votantes (e um valor corrigido de eleitores de 8.319.105 pessoas, conforme acima procurei demonstrar), nesta eleição presidencial de 2011 alcançar-se-ia no território nacional uma abstenção de 46,15% (em vez dos oficiais 52,48% da propalada maior abstenção de sempre em eleições presidenciais). Sem contarmos com o boicote governamental da votação de eleitores que, por causa da sua adesão ao Cartão do Cidadão, não conseguiram votar, num número que até agora não ´foi contabilizado...
O problema do empolamento artificial do recenseamento tem de ser resolvido de vez. Mas importa que o Ministro da Justiça explique o crescimento paranormal de 592.491 (6,7%) entre 2006 e 2010 do número de inscritos nos cadernos eleitorais.
Pós-Texto (21:26 de 26-1-2011): A confissão do boicote eleitoral do Governo socialista
Num sinal de frustração com a derrota e de mau perder, o ministro Pedro Silva Pereira argumentou, ontem , 25-1-2011, na Rádio Renascença que Cavaco Silva é «com menos votos do que na primeira eleição e é o Presidente reeleito que obtém menor percentagem» (presume-se que de votos).
Jorge Sampaio teve 55.55%, em 2001 e Cavaco Silva agora 52,95%, mas Sampaio teve também menos votos na reeleição (2. 401.015 em 2001, contra 3.035.056 em 1996). A eleição de 2001 teve 4.449.800 votos e a de 2011 um valor superior de 4.491.422, ainda que as percentagens de abstenção (50,29% em 2001 e 53,42% em 2011) sejam significativamente divergentes pelo efeito de empolamento do número de eleitores nos cadernos eleitorais desactualizados.
De qualquer modo, a referência ao valor elevado da abstenção que o Governo socialista se esforçou tão diligentemente por cumprir com boicote administrativo e recusa da habitual campanha mediática maciça de recomendação aos eleitores para cumprirem o seu dever cívico, é uma espécie de confissão de culpa. Isto é, louva-se o que se fez...